OBESIDADE – PORQUE É QUE
A MUDANÇA É EMERGENTE?

Artigo de Lígia Mendes - Cardiologista
26 jul 2021

São 14h, vou começar o meu turno da tarde de consultas. Chamo a minha primeira doente da lista, é uma primeira vez. Senta-se à minha frente com um olhar a clamar por ajuda!

– Dr.ª, canso-me muito, não consigo subir as escadas, fico sem fôlego!

- Quase tudo me cansa!

Comecei por fazer uma história clínica detalhada, mas independentemente do que iria descobrir, a minha doente tinha razões de sobra para se cansar: media 165 cm, pesava 94 kg e claramente sofria de obesidade!

Esta é uma história fictícia, mas esta doente é igual a tantas outras/os que me procuram diariamente, com queixas de cansaço.

Apesar de as nossas atenções andarem mais focadas em outros temas da atualidade, o problema da obesidade não desapareceu e tememos mesmo que se tenha agravado com tantas restrições a que temos sido obrigados. Um estudo norte-americano revelou que a obesidade infantil aumentou de 13% para 15% entre 2019 e 2020 e tudo nos leva a crer que o mesmo se passou na população adulta.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que, em 2025, 18% dos homens e 21% das mulheres estarão acima do limite que define o diagnóstico de obesidade (índice de massa corporal – IMC >30). Infelizmente, temo que não teremos de esperar tanto para atingirmos essa meta.

A OBESIDADE CARACTERIZA-SE POR:

A obesidade visceral (tronco e abdómen), sobretudo, traduz acumulação de lípidos (gorduras) onde naturalmente não deviam estar

Estas gorduras são metabolicamente ativas, ou seja, produzem substâncias que alteram o normal funcionamento do organismo

Entre os fenómenos de destabilização encontra-se a inflamação (aumento da atividade imune contra o próprio organismo) e a ativação do sistema nervoso autónomo simpático (aumento da adrenalina circulante)

AS ALTERAÇÕES PROVOCADAS PELA OBESIDADE LEVAM A:

DIABETES

De uma forma simplista – o mecanismo é muito mais complexo –, a inflamação impede o normal metabolismo da glicemia (açúcar). O músculo perde a capacidade de utilizar a glicose e esta acumula-se na nossa circulação sanguínea, ou seja, entramos numa fase de resistência à insulina. E porque é que este evento é crítico? Porque a resistência à insulina não é nada mais, nada menos do que um estado de pré-diabetes.

HIPERTENSÃO ARTERIAL

A inflamação, juntamente com a adrenalina, aumenta a rigidez das artérias, que ficam menos elásticas e com capacidade de adaptação aos fluxos e surge a hipertensão.

DISLIPIDEMIA (excesso de gordura no sangue)

Os lípidos (gorduras) acumulam-se no sangue, adquirem formas bizarras e disfuncionais. A inflamação latente promove a sua acumulação dentro das paredes das artérias, obstruindo-as. Caso não se ponha cobro à evolução natural da obesidade, um desfecho menos bom está à vista! Neste desfecho, incluem-se eventos cardiovasculares, como o enfarte agudo do miocárdio e o AVC (acidente vascular cerebral)!

Felizmente é possível contrariar o desfecho menos favorável da obesidade. Para isso, a mudança está nas nossas mãos! É possível, com esforço e resiliência. Podemos ganhar anos de vida e, mais importante, podemos ganhar qualidade de vida enquanto vivermos!

Referências:

 1. Jenssen BP, et al. COVID-19 and Changes in Child Obesity. Pediatrics. 2021;147(5):e2021050123.

2. Huang PL. A comprehensive definition for metabolic syndrome. Dis Model Mech. 2009;2(5-6):231-7.

3. Samuel VT, Shulman GI. Mechanisms for insulin resistance: common threads and missing links. Cell. 2012;148(5):852-71.

4. Ferrannini E, Cushman WC. Diabetes and hypertension: the bad companions. Lancet. 2012;380(9841):601-10.

Artigo de Lígia Mendes - Cardiologista

Nesta vida que corre a cem à hora, mesmo sendo médica é difícil não sermos levados pela corrente. Para me lembrar para onde vou, todos os dias antes de começar o dia repito a mim própria “Hoje tenho de ajudar pelo menos uma pessoa, se forem mais ainda melhor”. Por isso decidi abraçar o Cardio da Vida, uma ferramenta que me pode ajudar a manter-me a mim e aos outros no caminho certo.

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