Emagrecer: muito além da balança
Tiago Santos - Docente de Desporto
Publicado no dia 14 de novembro de 2024
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Iniciar uma rotina de exercício físico com o objetivo de perder peso é uma experiência cheia de contrastes emocionais. Por um lado, a motivação de ter decidido mudar, e, por outro, a insegurança das dificuldades e incerteza dos resultados que pretende alcançar.
As primeiras semanas são marcadas por um grande entusiasmo e expectativa de que os objetivos estão ao virar da esquina! Entusiasmo que rapidamente é substituído por frustração, quando os resultados esperados não aparecem tão rapidamente. Afinal, será necessário mais do que 3 ou 4 semanas de esforço do que tinha pensado.
Nas redes sociais o que não faltam são histórias de impressionantes transformações corporais em curtos períodos, criando a falsa ideia de que os resultados são instantâneos e desprovidos de esforço. Fórmulas mágicas, exercícios milagrosos, promessas de transformação. Mas na verdade não passam de promessas… Não acredite em tudo o que vê nas redes sociais.
Antes de mais, é importante entender que o progresso físico e as mudanças corporais são um processo gradual, que podem levar semanas ou até meses a serem observados, especialmente se a sua forma de medir o resultado do seu sucesso é a balança!
Para muitos, o número na balança descer é o principal sinal de sucesso e quando isso não acontece o fracasso parece iminente. Rapidamente são desencadeadas emoções negativas como frustração, desmotivação e até o abandono. É natural que essa alta expectativa gere alguma ansiedade, mas o corpo precisa de tempo para se adaptar aos novos estímulos do treino. Este paradoxo entre o esforço e a falta de resultados visíveis pode minar a motivação, levando à sensação de que o treino “não está a funcionar”. Mas calma, não desista já!
A obsessão com a balança
A balança é sem dúvida uma ferramenta útil para medir o progresso físico, dos métodos mais utilizados especialmente quando o objetivo é perder peso, mas pode ser contraproducente, limitador e nem sempre conta a história toda.
A obsessão com o peso da balança está profundamente enraizada nas nossas expectativas sociais e culturais sobre o corpo ideal, mas a realidade é que o peso corporal não conta toda a história do progresso físico. O número que aparece na balança representa a soma do peso de músculos, gordura, água, ossos e órgãos. Ao focar-se apenas na balança, está a ignorar as muitas variações naturais que podem ocorrer de dia para dia e as transformações benéficas que o corpo está a passar, que podem não refletir-se imediatamente no peso.
Algumas das razões pelas quais a balança pode não mostrar o progresso real, são por exemplo, o aumento de massa muscular. Os músculos são mais densos do que gordura, o que significa que, embora a composição corporal esteja a melhorar (mais músculo e menos gordura), o peso pode não diminuir significativamente. Isto não significa que não está a progredir, antes pelo contrário. A massa muscular é extremamente importante para manter a gordura em níveis mais baixos e está associada a maior saúde e longevidade.
Outros exemplos são a retenção de líquidos e os ciclos hormonais. O corpo humano, quando sujeito a novos estímulos, como o treino, pode reter mais líquidos para reparar os músculos danificados ou eliminar toxinas. Além disso, hormonas como o cortisol, libertadas em resposta ao stress (incluindo o stress do treino), podem levar à retenção de água. Tudo isto pode refletir-se numa não descida do peso na balança, mesmo que a gordura corporal esteja a diminuir.
E as balanças de bioimpedância? Úteis, mas com moderação
As balanças de bioimpedância, aquelas que muitas vezes encontramos nos ginásios, são dispositivos populares, utilizados para medir a composição corporal, oferecendo uma análise mais detalhada do que apenas o peso, ao estimarem a percentagem de gordura corporal, massa muscular, massa óssea e até a quantidade de água no corpo.
Embora pareçam ser uma solução avançada e prática para quem procura monitorizar de forma mais precisa os seus resultados de treino, estas balanças também têm limitações significativas que podem induzir em erro.
A bioimpedância baseia-se na medição da resistência elétrica dos tecidos do corpo. Ao subir à balança, uma corrente elétrica de baixa intensidade percorre o corpo e mede a resistência encontrada. Como os músculos, a gordura, os ossos e a água conduzem eletricidade de maneiras diferentes, o dispositivo utiliza essa resistência para estimar a percentagem de gordura corporal e os outros parâmetros. No entanto, apesar de parecer um método avançado, a bioimpedância tem várias falácias e limitações que a tornam menos confiável do que muitos pensam, nomeadamente:
Variações de hidratação corporal: A quantidade de água no corpo afeta diretamente os resultados. Como a água é um bom condutor de eletricidade, estar mais ou menos hidratado pode distorcer os resultados. Se alguém estiver desidratado, a balança pode interpretar a falta de água como maior percentagem de gordura, e vice-versa. O consumo de álcool ou uma refeição pesada antes da medição também pode afetar os resultados, aumentando a variação nos números apresentados.
Diferença de resultados ao longo do dia: O estado do corpo pode mudar significativamente ao longo do dia. Por exemplo, as medições de bioimpedância podem diferir dependendo da hora em que são realizadas, devido à retenção de líquidos ou ao esvaziamento da bexiga. Medir de manhã em jejum versus à noite, após uma refeição e ingestão de líquidos, pode gerar grandes diferenças, criando uma falsa perceção de progresso ou retrocesso.
Estimativas, não medições diretas: É importante ter em mente que estas balanças são dispositivos que estimam a composição corporal com base em equações predefinidas e fatores como altura, idade, sexo e peso. Estas equações podem não refletir a realidade de cada pessoa, principalmente em indivíduos com uma distribuição de massa muscular e gordura atípica. Portanto, os valores apresentados não são medições diretas, mas sim aproximações que podem estar longe de serem exatas.
Apesar destas limitações, a balança de bioimpedância pode ser útil quando usada de forma consistente e em conjunto com outras ferramentas de medição.
Afinal, como posso monitorizar as mudanças além da balança e que métodos podem ser mais fiáveis?
O corpo humano é complexo e o progresso físico abrange muitos fatores. Diria que utilizar uma combinação de métodos oferece uma visão mais precisa e abrangente da evolução.
Ao invés de medir o sucesso com base num único fator, como o peso e a balança, é importante considerar uma série de outros elementos que refletem de forma mais fiel a evolução do corpo.
Existem muitos métodos, mas destaco 3 que são simples de utilizar por qualquer pessoa.
Medidas corporais: Medir circunferências de várias partes do corpo — como cintura, anca, peito, braços e pernas — pode ser uma forma eficaz de acompanhar mudanças na composição corporal. À medida que perde gordura e ganha músculo, as medições de circunferência podem mudar, mesmo que o número na balança não varie significativamente. As medições de circunferência captam onde está a ocorrer a perda de gordura ou o ganho de músculo, proporcionando uma visão mais localizada do progresso, em vez de se focar apenas no peso total.
Fotos de progresso: Tirar fotografias periódicas do seu corpo, na mesma posição e nas mesmas condições (iluminação, ângulo, roupa interior), é uma forma simples e eficaz de visualizar as mudanças. Muitas vezes as mudanças físicas são subtis e não as percebemos no dia a dia, mas as fotos permitem comparar de forma objetiva. Experimente 4 em 4 semanas! As fotografias captam mudanças visíveis na forma corporal, algo que o peso ou as medições numéricas podem não refletir. É uma forma poderosa de acompanhar o progresso, especialmente quando a motivação diminui.
Ajuste das roupas: A forma como a roupa assenta pode ser um dos melhores indicadores de progresso. Muitas vezes, à medida que perde gordura e ganha músculo, o seu corpo ajusta-se de formas que não são imediatamente visíveis na balança, mas que são sentidas no dia a dia. A sensação de que as roupas estão mais folgadas ou de que o corpo está a ficar mais tonificado é um sinal claro de que as mudanças estão a acontecer, independentemente dos números na balança.
Tenha ainda em atenção que para alcançar medições corporais eficazes deve:
Ser consistente: Faça as medições sempre no mesmo horário do dia (de preferência pela manhã, em jejum) para garantir a precisão.
Utilizar as ferramentas adequadas: Use uma fita métrica flexível para fazer as medições com precisão.
Realizar um registo: Mantenha um registo detalhado para comparar os resultados ao longo do tempo.
Por fim, lembre-se de que a adaptação ao treino, seja no ginásio, ou praticando qualquer atividade física, é um processo gradual. Resultados visíveis, especialmente aqueles ligados à estética, podem demorar a aparecer, mas as mudanças internas – como aumento de força, resistência e energia – acontecem muito antes. É crucial manter o foco em metas a longo prazo e valorizar cada pequena vitória no caminho.
Referências:
1. James SN, et al. Timing of physical activity across adulthood on later-life cognition: 30 years follow-up in the 1946 British birth cohort . J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2023;94(5):349-356.
2. Galle SA, et al. The effects of a moderate physical activity intervention on physical fitness and cognition in healthy elderly with low levels of physical activity: a randomized controlled trial. Alzheimers Res Ther. 2023;15(1):12.
3. Palmer JA, et al. Hippocampal blood flow rapidly and preferentially increases after a bout of moderate-intensity exercise in older adults with poor cerebrovascular health. Cerebral Cortex, Volume 33, Issue 9, 1 May 2023, Pages 5297–5306.
4. Ciria LF, et al. An umbrella review of randomized control trials on the effects of physical exercise on cognition. Nat Hum Behav. 2023;7(6):928-941.