O Impacto do Exercício Extremo na Saúde e Longevidade
Vanessa Santos - Fisiologista do exercício
Publicado no dia 18 de setembro de 2024
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O exercício extremo é caracterizado por atividades de alta intensidade e longa duração. Tem sido cada vez mais alvo de numerosos estudos para compreender os seus efeitos na saúde e na longevidade.
Embora o exercício moderado seja amplamente reconhecido pelos seus benefícios, o impacto de exercícios em níveis extremos ainda suscita debates entre os especialistas.
Atletas que se envolvem em exercícios extremos, como ultramaratonistas e triatletas, geralmente possuem uma capacidade aeróbia excecional. Pesquisas indicam que o consumo máximo de oxigénio (VO2máx) desses indivíduos é significativamente superior ao da população geral, o que está associado a uma saúde cardiovascular robusta e a uma maior longevidade. Esse VO2máx elevado permite que o corpo utilize o oxigénio de forma mais eficiente durante exercícios intensos, promovendo uma maior resistência e recuperação mais rápida.
Mas para tal é também importante manter uma composição corporal otimizada, com uma baixa percentagem de gordura e maior percentagem de massa muscular, essencial para o desempenho desses atletas. Tal composição corporal não só melhora o desempenho desportivo, mas também reduz os riscos de doenças metabólicas, como diabetes tipo 2 e hipertensão arterial. Manter uma composição corporal saudável é essencial para evitar condições clínicas que impactam negativamente a saúde e consequentemente afetem a esperança média de vida.¹
O coração dos atletas de resistência é frequentemente maior e mais eficiente, um fenómeno conhecido como “coração de atleta”. Este tipo de adaptação permite uma maior capacidade de bombear sangue com menos esforço, contribuindo para uma menor frequência cardíaca em repouso e reduzindo o risco de doenças cardíacas a longo prazo. No entanto, a alta intensidade e o volume de treino necessários para exercícios de resistência extrema aumentam o risco de lesões musculoesqueléticas. Lesões como fraturas por stress, tendinites e lesões ligamentares são comuns e podem comprometer a qualidade de vida a longo prazo. A prevenção e o tratamento adequados são essenciais para a longevidade no desporto.²
Embora o exercício moderado seja benéfico para o coração, há evidências de que também o exercício extremo pode trazer benefícios, mas também pode causar danos cardiovasculares. Pesquisas indicam que maratonistas e triatletas de longa data podem desenvolver anomalias cardíacas, como fibrose miocárdica e calcificação das artérias coronárias, aumentando o risco de arritmias e outros problemas cardíacos. Mas além disso, o exercício extremo pode proporcionar benefícios significativos, como por exemplo na saúde mental, reduzindo os níveis de stress, ansiedade e depressão. A sensação de conquista e a liberação de endorfinas durante essas atividades intensas contribuem para um estado emocional positivo.
No entanto, existe o risco de dependência do exercício, onde estes indivíduos sentem uma necessidade compulsiva de se exercitarem, mesmo quando se encontram lesionados ou exaustos. Essa dependência pode levar a um ciclo de desgaste físico e mental, impactando negativamente a sua saúde geral.
Um estudo recente mostrou que corredores que conseguem completar uma milha em menos de quatro minutos vivem, em média 4,7 anos a mais do que a população geral. A pesquisa analisou os primeiros 200 corredores a atingirem essa marca histórica e descobriu que esses atletas possuem uma longevidade significativamente maior, sugerindo que o exercício extremo, quando bem gerido, pode trazer benefícios substanciais para a saúde a longo prazo.³ Este estudo destaca que, apesar dos riscos associados ao exercício extremo, os benefícios podem superar esses riscos quando a atividade é bem gerida. Por outro lado, é crucial notar que nem todos os indivíduos que se dedicam ao exercício extremo possuem o mesmo nível de condicionamento físico ou resiliência. Para muitos, o risco de lesões e problemas de saúde pode aumentar significativamente se os treinos não forem adequadamente monitorizados e equilibrados.³
Os benefícios do exercício extremo são notáveis. A capacidade aeróbia aumentada e a saúde cardiovascular robusta são apenas alguns dos aspetos positivos. No entanto, é vital que atletas e entusiastas do exercício extremo estejam cientes dos sinais do corpo e que o pratiquem com moderação para evitar problemas de saúde a longo prazo. É igualmente importante considerar que os benefícios do exercício moderado também são significativos e podem ser alcançados sem os riscos associados ao exercício extremo. Portanto, a chave para uma vida longa e saudável pode estar em encontrar um equilíbrio entre intensidade e recuperação, garantindo que o corpo tenha tempo suficiente para se recuperar e evitar o desgaste excessivo.
Em resumo…
O exercício extremo oferece tanto benefícios quanto riscos para a saúde. Enquanto ele pode melhorar a capacidade aeróbia, a composição corporal e a função cardiovascular, também pode causar lesões, síndrome do excesso de treino e problemas cardíacos.
A chave está no equilíbrio e na moderação. Atletas e entusiastas devem prestar atenção aos sinais do corpo e garantir uma recuperação adequada para evitar os efeitos adversos a longo prazo.
Promover estilos de vida ativos e saudáveis é essencial para melhorar a qualidade e a esperança média de vida, mas é igualmente importante entender os limites do corpo e equilibrar a intensidade do exercício para maximizar os benefícios e minimizar os riscos.
A prática de exercício físico deve ser sempre acompanhada de orientação profissional e médica, especialmente quando se trata de atividades de alta intensidade e longa duração. Com uma abordagem equilibrada e consciente, é possível colher os frutos do exercício físico sem comprometer a saúde e a longevidade.
Referências:
1. Eijsvogels TMH, Thompson PD, Franklin BA. The “Extreme Exercise Hypothesis”: Recent Findings and Cardiovascular Health Implications. Curr Treat Options Cardiovasc Med. 2018 Aug 28;20(10):84. doi: 10.1007/s11936-018-0674-3. PMID: 30155804; PMCID: PMC6132728.
2. La Gerche, A., & Heidbuchel, H. (2014). Can intensive exercise harm the heart? You can get too much of a good thing. Circulation, 130(12), 992-1002. https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.114.008141;
3. Foulkes S, Hewitt D, Skow R, et alOutrunning the grim reaper: longevity of the first 200 sub-4 min mile male runnersBritish Journal of Sports Medicine Published Online First: 10 May 2024. doi: 10.1136/bjsports-2024-108386.